Caros,
Em primeiro lugar, quero agradecer a lembrança e o carinho do convite para participar deste grupo.
Sou professora e moro no Rio de Janeiro.
Em segundo lugar, aceitar a proposta de reflexão sobre a alteração do ECA, no que diz respeito à punição legal/policial para os alunos violentos e desrespeitosos.
Vamos por partes...
Como não caminho sozinha, trago, em princípio o Bernardo Toro, quando diz que: "Não é possível pensar em sociedade sustentável com uma Educação para os nossos filhos e outra para os filhos dos outros."
Aos colegas que gostaram da intenção de termos policiais dentro das escolas para disciplinar os alunos com a lei, penso que só corroboram com a ideia porque ela trata dos filhos dos outros. É difícil aceitar uma situação dessas na escola em que nossos filhos estudam...
Em seguida, leio uma entrevista com Michael Barber (conselheiro na área de Educação e ex assessor de Tony Blair no MEC britânico) em que ele diz o seguinte: "As pessoas precisam escolher seguir a carreira de professor, e não virar um deles apenas porque não tinham nada melhor para fazer". E eu acrescento: além de acreditarem que fazer qualquer licenciatura, ao invés do bacharelado, ou mesmo o curso de Pedagogia, é mais fácil e rápido.
Infelizmente, a grande maioria dos profissionais do ensino com os quais lidamos diariamente, faz parte desse grupo.
Infelizmente, vivemos uma situação legítima que é a necessidade de nos formarmos rapidamente, para poder entrar no mercado de trabalho (sic!) e começar a nossa vida profissional o mais cedo possível. É uma questão de sobrevivência. Sabemos que é difícil um professor ficar sem trabalho. Pagam pouco nos colégios particulares, não respeitam as obrigações trabalhistas, mas sempre há vagas... na rede pública, o descaso é o mesmo, mas sempre tem concurso pro magistério. E quando tudo isso falhar, podemos oferecer "aulas de reforço" pra vizinhança.
A esses dois pontos acrescento a questão - que já foi citada aqui na lista, nesta reflexão - por que é que precisamos de interferência externa para administrar o que é o nosso fazer interno, cotidiano? Por que é que é precisamos de leis para estabelecer o que é certo, errado, adequado, não adequado, aceitável, não aceitável na nossa rotina de trabalho? Por que é que precisamos transferir uma responsabilidade que é nossa para a tutela do Estado?
Algumas tentativas de resposta: porque acreditamos que a educação deve vir de casa... porque professor não é psicólogo... porque os alunos vêm para escola e não querem nada... porque os alunos não entendem que têm que ficar quietos na hora de ficar quietos, e só falar quando lhes for dada essa condição... porque nós não ganhamos para isso... pra ficar estressados e nem para lidar com marginais...
Será que já ouvimos essas "verdades" por aí?
Pois, na contramão dessa realidade recheada de senso comum, peço a companhia do Frei Betto que diz que "Falta à escola abordar o sentido da existência." E afirmo que não é fácil, mas essa é a nossa tarefa, pessoal e intransferível. Esse é o nosso fazer profissional: ajudar a formar seres humanos. Seres humanos de verdade, daqueles que falam, riem, conversam, têm dor de cabeça, caganeira, choram, ficam com raiva, daqueles iguaizinhos a nós mesmos.
Temos que ser psicólogos sim, um pouco mães, um pouco pais, às vezes, pacientes, outras, impacientes. Somos educadores do/no Brasil, fazendo história e nos reconciliando com meninos e meninas que vivem castigados pela vida, por esse país afora.
Não somos repassadores de conteúdos cristalizados. Somos pessoas adultas numa relação de dar as mãos e caminhar juntos, de ensinar e aprender juntos.
Não dá pra burocratizar a relação professor com aluno. Entrar na escola, cumprimentar ou não os colegas, ir para a sala de aula, já pensando na hora de ir embora para fazer coisas mais importantes...
Digo sempre para os meus professores e alunos que Escola não é lugar de violência de qualquer espécie: física, moral, psicológica; assim como não é lugar de medo. Quem quiser sentir essas emoções, que frequente delegacias, presídios e quartéis.
Da mesma maneira que Escola não é lugar de silêncio. Lugar de silêncio é hospital e locais de meditação.
Escola não é lugar de nãos absolutos, mas justificáveis; Escola não é lugar de regras desprovidas de sentido compartilhado por todos.
Escola é lugar de sins, de acolhimento, de imperfeições, de constantes ajustes, de acordos e combinados.
Mas, vou contar um segredo: tem que querer ser professor, educador, formador, mediador - o nome que queiram dar. E mais: tem que querer olhar nos olhos e ser verdadeiro, sem medo de errar e sem nojo de meleca, catarro, cheiro de mijo ou de maconha. Tem que gostar de pessoas e de ficar perto delas, com elas.
Não abro mão de estar junto com meus alunos e professores, pois escolhi ser professora, que é diferente de ser missionária... É minha profissão, e requer, estudo e técnica, em constante aperfeiçoamento para praticar melhor. Requer salário e dignidade.
Requer que eu mesma me dê esse crédito.
Um grande e fraterno abraço
Denise Vilardo
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