segunda-feira, 18 de junho de 2012

IMPRENSA, HISTÓRIA E SEPARATISMO: O MOVIMENTO SEPARATISTA DE 1892 ATRAVÉS DAS PÁGINAS DO MONITOR SUL-MINEIRO



IMPRENSA, HISTÓRIA E SEPARATISMO: O MOVIMENTO SEPARATISTA DE 1892 ATRAVÉS DAS PÁGINAS DO MONITOR SUL-MINEIRO *
Parte Dois

10 Na década de 1880, um projeto parlamentar apresentado pelo senador paulista Joaquim Floriano de Godoy apresentava o mesmo intuito de anexar parte do Sul de Minas Gerais à província de São Paulo. Essas eram suas disposições: “Art. 1º. As divisas entre as províncias de S. Paulo e Minas Gerais principiam no alto da serra da Mantiqueira no braço próximo ao rio Lourenço Velho até encontrar o rio Sapucaí Guaçu e deste por ele abaixo até o rio Grande.” (MONITOR SUL-MINEIRO, 26/08/1880, p.1).
Há que se destacar que a ascensão do partido conservador à esfera nacional do poder, a partir de meados da década de 1840, estimulou as propostas de desmembramento do extenso território de Minas Gerais. Isso porque o Movimento Liberal de 1842 havia incutido em alguns políticos conservadores o temor de que Minas Gerais viesse a se constituir em uma grande província central que, com seu contingente populacional e sua capacidade de mobilizar recursos nacionais, pudesse desestabilizar a ordem de outras regiões (MELO 1996: 30).
Os primeiros projetos de teor separatista apresentados à Câmara dos Deputados na década de 1840 propunham a anexação do Sul de Minas Gerais ao território de São Paulo10. Entretanto, tal plano encontrou resistência por parte de alguns políticos mineiros que pretendiam a criação de uma nova província na região sul-mineira.
Em sessão legislativa da Câmara dos Deputados, a 29 de abril de 1843, o conselheiro Bernardo Jacinto da Veiga assim se exprimiu pela divisão de Minas Gerais:
Sou de opinião que a província de Minas deve dividir-se, e se aparecesse nesta casa um projeto compreendendo esse pedaço (comarca do Sapucaí), parte da comarca do Rio Verde, e mais alguma coisa para formar uma província, eu daria o meu voto com muita satisfação (VEIGA apud VALLADÃO, 1940: 166).
Conquanto essa idéia não tenha se concretizado, o separatismo sul-mineiro teve de esperar mais de um decênio para ser novamente discutido em âmbito parlamentar.
A década de 1850 foi extremamente fértil para a criação de novas províncias e para a demarcação das fronteiras inter-regionais. Isso porque ela sinalizou o apogeu do Segundo Império e da Política de Conciliação por ele instituída (VALLADÃO, 1940: 165). 52
11 Sobre este projeto, comenta Xavier da Veiga: “na câmara dos deputados é apresentado e fundamentado um projeto elevando à categoria de província, com a denominação de província de Minas do Sul, o território mineiro assim limitado entre o Rio de Janeiro, São Paulo e Goiás: pelo Rio Turvo até a sua confluência no Rio Grande; este abaixo até as contravertentes do Rio São Francisco, a alcançar a cordilheira que divide as águas do mesmo Rio das do Rio Paranaíba; e este abaixo desde sua nascente até os limites de Goiás. A projetada Minas do Sul deveria ter por capital a cidade da Campanha. Apresentou e fundamentou o projeto o Dr. Evaristo da Veiga, subscrevendo-o mais de 46 deputados (VEIGA, 1998, p.740).
Por ocasião da criação da província do Paraná em 1853, reacenderam-se as discussões sobre a divisão territorial de Minas Gerais e sobre a provincialização da região sul-mineira. Um ano depois, em 1854, um dos deputados pelo Distrito Neutro, o conselheiro Francisco Octaviano, apresentou à Câmara Projeto de Lei que estipulava as seguintes decisões:
Art. 1º As Comarcas do Sapucaí, Rio Verde e Três Pontas, e o município de Lavras, pertencentes à província de Minas, formarão uma nova província. Tendo por capital provisória o lugar que o governo designe, até definitiva resolução da assembléia provincial respectiva.
Art. 2º Os limites atuais daqueles pontos em relação às outras províncias, depois de verificados administrativamente, serão os limites da nova província (MONITOR SUL-MINEIRO, 13/07/1873: 1).
Observa-se, pelo teor de seus artigos, que o projeto separatista de 1854 não primava pelo detalhamento das disposições legais, tendo sido, por isso, rejeitado.
Ao refletir sobre o caráter político dos projetos parlamentares até agora analisados, Valladão afirma que a maioria tinha como objetivo o enfraquecimento político de Minas Gerais e não o fortalecimento da região sul-mineira. Ademais, nenhum projeto estipulava a criação imediata de uma nova província no Sul de Minas Gerais (VALLADÃO, 1940: 170).
Em 1862, o deputado Dr. Evaristo Ferreira da Veiga apresentou, sem êxito, Projeto de Lei que dividia Minas Gerais em duas partes e criava uma nova província com a denominação de Minas do Sul11. Suas disposições eram as seguintes:
Art. 1º Fica elevado à categoria de província, com a denominação de província de Minas do Sul, o território da província de Minas Gerais, compreendido entre as do Rio de Janeiro, São Paulo e Goiás, tendo por limites o rio Turvo até sua confluência no rio Grande; este abaixo até as contravertentes do Rio São Francisco, a alcançar a cordilheira que divide as águas do mesmo rio São Francisco das do rio Paranaíba; e este abaixo desde sua nascente na mesma cordilheira até os limites da província de Goiás. 53
Art. 2º A nova província terá por capital a cidade da Campanha da Princesa, enquanto a assembléia respectiva não decretar o contrário.
Art. 3º A província de Minas do Sul dará três senadores e dez deputados à assembléia geral; sua assembléia provincial constará de 28 membros. Dos 10 atuais senadores da província de Minas Gerais serão designados por parte, em sessão do senado, depois de sancionada esta lei, os três que serão considerados da província de Minas do Sul.
Art. 4º Os atuais 3º e 4º distritos eleitorais da província de Minas Gerais darão cada uma 2, em vez de 3 deputados e o 7º continuará a dar 2; e a mesma província dará sete senadores e sua assembléia provincial terá 35 membros.
Art. 5º A Província de Minas do Sul fica dividida em dois distritos eleitorais: o 1º compreendendo os municípios da Aiuruoca, Baependi, Cristina, Itajubá, Jaguari, Pouso Alegre, Caldas, Alfenas, Campanha, Três Pontas e Lavras; e o 2º as de Passos, Jacuí, Uberaba, Desemboque, Araxá, Campo Grande, Prata, Bagagem e Patrocínio; continuando a ser apuradora do 1º distrito a câmara municipal da Campanha da Princeza e será do 2º a do Araxá.
Art. 6º O governo fica autorizado para criar na província de Minas do Sul administração dos correios, tesouraria de fazenda, que será encarregada também da arrecadação e administração das atuais rendas provinciais enquanto a assembléia respectiva não decretar o contrário, e as secretarias de polícia e da presidência, subsistindo a organização desta enquanto a mesma assembléia não alterá-la (MONITOR SUL-MINEIRO, 1873: 1).
Em matéria de detalhamento e forma, o projeto de Evaristo da Veiga significou uma evolução das idéias separatistas esboçadas no projeto de 1854. Nele estão apontados com precisão os limites da nova província, a capital provisória, o número de representantes na assembléia respectiva, na câmara dos deputados e no senado, além dos distritos eleitorais e seus respectivos municípios apuradores.
Como pode se perceber, a circunspeção pretendida para a nova província era bastante extensa: abarcava não somente as comarcas do Sul de Minas Gerais como as da Zona da Mata e até mesmo as do Triângulo Mineiro. Estima-se, com isso, o quão significativa seria a perda territorial de Minas Gerais, caso esse intento tivesse se concretizado.
Embora tenha alcançado número considerável de votos, o Projeto de Lei de Evaristo da Veiga não resistiu à dissolução da Assembléia Legislativa no ano de 1863 e nem ao fim da Política de Conciliação (BUENO, 1900: 16). Suas disposições legais, todavia, serviram de base para outro Projeto de Lei, apresentado pelo deputado Américo Lobo, a 11 de Julho de 1868 12, como pode se perceber:
12 Sobre esta data, segue-se o comentário de Xavier da Veiga: “É apresentado na câmara dos deputados pelo Sr. Dr. Américo Lobo Leite Pereira um projeto elevando à categoria de província, com a denominação de 54
província do Sapucaí, os municípios de Lavras e os que compõem as comarcas de Baependi, Jaguari, Sapucaí e Rio Grande (menos o termo de Pium-í) tendo por capital a cidade da Campanha” (VEIGA, 1998, p.670). Como os Projetos anteriores, esse ficou sem a decisão da Assembléia Legislativa.
13 A respeito deste projeto, informa Xavier da Veiga: “Projeto oferecido à câmara dos deputados pelo Dr. Olímpio Valladão, deputado por Minas, criando a província de Minas do Sul. É idêntico aos que foram apresentados a 3 de agosto de 1862 e a 11 de julho de 1868 pelos deputados Evaristo da Veiga e Américo Lobo. Sobre esses três projetos, nunca deliberou a Assembléia Legislativa. O mesmo sucedeu em relação ao projeto que, com fim semelhante, foi apresentado na câmara a 3 de Agosto de 1854” (VEIGA, 1998, p.663).
Art. 1º Ficam elevados à categoria de província, com a denominação de província do Sapucaí, o município de Lavras e os que compõem as comarcas de Baependi, Jaguari, Sapucaí e Rio Grande, da província de Minas Gerais, menos o termo de Pium-í.
Art. 2º A cidade da Campanha da Princesa será a capital da província do Sapucaí, enquanto a respectiva assembléia não deliberar o contrário.
Art. 3º A província do Sapucaí dará 2 senadores e 5 deputados à Assembléia Geral; sua Assembléia Provincial comporá de 28 membros. Dos 10 senadores da província de Minas Gerais serão designados por sorte, em sessão do Senado, depois de sancionada a presente lei, os que serão considerados da província do Sapucaí.
Art. 4º Dará 2 deputados à Assembléia Geral o atual 3º distrito da província de Minas Gerais, cuja Assembléia Provincial constará de 45 membros.
Art. 5º A província do Sapucaí fica dividida em dois distritos eleitorais, dos quais o 2º dará dois deputados à Assembléia Geral e doze à Provincial: o governo designará os respectivos colégios eleitorais e câmaras apuradoras.
Art. 6º O governo fica autorizado para criar na província do Sapucaí a administração dos correios, tesouraria da fazenda, que será também encarregada da administração e arrecadação das atuais rendas provinciais, enquanto a respectiva assembléia não decretar o contrário, e as secretarias da polícia e presidência, subsistindo à organização desta, enquanto a mesma assembléia não altera-la. [...] (MONITOR SUL-MINEIRO, 20/07/1873: 1).
Menos pretensioso que o projeto anterior, esse de 1868 também era claro quanto às divisas territoriais e às repartições administrativas municipais do Sul de Minas Gerais. Atente-se que a denominação escolhida para a nova província – Sapucaí – sugere que “até o nome de Minas deveria ser esquecido” naquela região (MELO, 1996: 30).
Um último projeto separatista foi apresentado à Câmara dos Deputados pelo Dr. Olímpio Valladão, a 8 de julho de 1884 13. Seu teor e forma não diferiam dos projetos anteriores, sendo que a circunspeção proposta para a nova província limitava-se apenas às comarcas do Sul de Minas Gerais (VALLADÃO, 1940: 175).
Esses foram, pois, os principais projetos apresentados em âmbito parlamentar com o intuito de separação e provincialização do Sul de Minas Gerais. O que eles têm em 55
comum, além do fim a que se destinavam, é o fato de serem de autoria de políticos campanhenses.

Amanhã acaba.

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