terça-feira, 8 de agosto de 2017

"NÃO APRENDEMOS COM O QUE TEM SIDO FEITO NOS ÚLTIMOS 20 ANOS."

André Lázaro: 'Não aprendemos com o que tem sido feito nos últimos 20 anos'

Embora ações pontuais como o Prêmio VivaLeitura tenham sido preservadas, para o professor da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Rio de Janeiro (UERJ), André Lázaro, pesquisador da Flacso-Brasil e diretor da Fundação Santillana, o conhecimento acumulado nas duas últimas décadas nas políticas públicas do livro e leitura teria muito a ensinar para o Brasil de hoje. Convidado pelo Blog do Galeno, dentro das comemorações de seus 10 anos, André faz um balanço da década para o setor.

1- Qual sua avaliação sobre os últimos 10 anos no que diz respeito às políticas públicas do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil?
André Lázaro: É importante registrar que algumas iniciativas ao longo dos últimos 10 anos permanecem ativas, como o Prêmio VivaLeitura, criado em 2006 e ativo até hoje. O Prêmio, que conta com a parceria MEC-MinC, apoio do CONSED e da UNDIME e parceria da OEI (Orgnização dos Estados Ibero-americanas) e Fundação Santillana, tem destacado iniciativas de bibliotecas públicas e privadas, redes de ensino, territórios e pessoas, reconhecendo que promover a leitura é tarefa de muitos. No entanto, em muitos casos, as políticas públicas do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil sofrem pelas frequentes descontinuidades que prejudicam sua efetiva incorporação no rol das iniciativas culturais. O Proler, por exemplo, já contou com forte apoio público, criou redes nacionais, desenvolveu programas consistentes ao longo dos anos 1990 para depois perder força e organização. Recentemente, a legislação que organiza a Biblioteca Nacional foi alterada e a direção do Proler cabe, agora, ao secretário-executivo do Ministério da Cultura. Ora, secretário-executivo tem inúmeras e imensas tarefas e embora atribuir a esse cargo possa parecer prestígio para a política, na prática significa que ela será tragada pelo um cotidiano de demandas que inundam os gabinetes dos secretários-executivos. Nos anos 2000, outras iniciativas tiveram lugar, como a Câmara Setorial do Livro e da Leitura, um espaço de diálogo entre atores relevantes no campo, mas sofreu descontinuidade. Do mesmo modo, o Plano Nacional de Livro e Leitura (PNLL), que se revelou um instrumento potente de articulação federativa e entre os setores público e privado não tem recebido o apoio necessário. A descontinuidade é, certamente, o maior empecilho para o bom desenvolvimento de políticas para o livro, a leitura, a literatura e bibliotecas no Brasil. Sem política clara, nem mesmo recursos, se e quando houver, adiantam pois não se trata de realizar ações espetaculares e eventuais, mas estruturar as iniciativas e articular potencialidades.

2- Em outras palavras, houve avanços, estacionou ou retrocedeu?
André Lázaro: Em minha avaliação há retrocessos pois não aprendemos com o que tem sido feito nos últimos 20 anos.

3- Na sua opinião, o que representou o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), lançado em 2006, e o que representa hoje?
André Lázaro: O PNLL representa uma possibilidade que foi abandonada ou negligenciada. Trata-se de uma estratégia corajosa e adequada pois articula os setores público e privado, mobiliza o pacto federativo, estimula o diálogo imprescindível entre educação e cultura em cada ente da federação. É possível fazer um balanço do que aprendemos com o PNLL? O que pode ser melhorado para que a estratégia do Plano seja fortalecida? Ou será que devemos deixar nas mãos do mercado as possibilidades de promoção do livro e da leitura?

4- Você crê que há, efetivamente, a compreensão e o entendimento dos atores sociais e políticos - editores, livreiros, autores, bibliotecários, especialistas e técnicos e gestores da área - com relação ao significativo e o papel das políticos públicas setoriais, a ponto de defendê-las, ou, ainda, o que prepondera é o interesse, legítimo, de que se tenha um ou outro projeto ou programa pontual?
André Lázaro: Creio que há percepções e compromissos desiguais quanto à relevância das políticas públicas para o setor. Para os que adotam uma visão liberal sobre o papel do estado, os projetos pontuais e os interesses específicos criam as condições satisfatórias. Acho essa compreensão incorreta e insuficiente para que a população do Brasil avance no domínio e desfrute da leitura literária. É preciso atuar de modo articulado em diversas frentes, como a formação de professores, desde os que atuam na primeira infância até a educação superior, passando pela educação de jovens e adultos. Neste particular, avançamos quando o MEC passou a incluir EJA na biblioteca do professor e jovens e adultos no Programa Nacional de Biblioteca Escolar. É preciso fortalecer as bibliotecas escolares e comunitárias, criar políticas que permitam a sobrevivência digna e ativa das pequenas livrarias, ampliar o acesso aos acervos públicos, promover o livro e a leitura como práticas culturais. Creio que a complexidade do processo exige parcerias entre os entes federados, entre educação e cultura, entre setores públicos e privados. Foi assim que alguns países avançaram e a Colômbia é sempre um exemplo com que podemos aprender.

5- Há quem enxergue o PNLL tendo como papel um conjunto de diretrizes, algo mais conceitual, para alinhar as ações de estado, empresas e sociedade, uma espécie de visão politica. E também há quem entenda que, além disso, também é preciso que se tenha metas, responsáveis, orçamentos e compromissos concretos, em cada gestão, inclusive nos âmbitos regionais e locais. Como você enxerga o PNLL?
André Lázaro: O PNLL é, inegavelmente, o fruto do amadurecimento do trabalho em parceria entre o MEC, o MinC, o setor produtivo do livro e da leitura e de contribuições de autores e especialistas. Nenhum plano é suficiente se não for testado, monitorado e avaliado. A meu ver, o abandono do PNLL significa que se perde a oportunidade de aprender com o que temos feito. Daqui a alguns anos, boas intenções vão tentar começar do zero, ignorando o que hoje sabemos e poderíamos levar adiante. De todo modo, pela força cultural, civilizatória e emancipatória do livro e da literatura, pelo empenho de muitos professores, técnicos, gestores, especialistas, editoras e livreiros, creio que vamos avançando lentamente, menos do que o necessário, mais do que o descaso com a política pode imaginar.

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