Redemoinhos
Rômulo Bini Pereira - O Estado de
S.Paulo
"Por aqui não
passam!"
Marechal Emílio
Mallet, 1866
Na minha geração,
jovens do interior do País aprendiam a nadar em rios de sua região. Fossem
caudalosos ou não, os maiores perigos enfrentados na aprendizagem estavam nos
redemoinhos. Os de menor porte era fácil eliminar, mas os demais, pela
enormidade da força e da velocidade que atingiam, era difícil anular. Aprendi
que, se fosse lançado um objeto de grande porte no centro eles - por exemplo, um
toro seco -, o equilíbrio circular de seus movimentos era interrompido e o
remanso se estabelecia no leito do rio.
Essas lembranças da
juventude surgem a propósito da grave crise político-institucional que assola o
País e, pela sequência de novos fatos negativos, se torna um imenso redemoinho
de final imprevisível. Será que não existe um toro seco para eliminá-lo e
permitir ao País retornar ao seu leito normal? Os três Poderes da União poderiam
executar esse papel salvador?
O Legislativo, com
pomposo protagonismo neste início de mandato, já demonstra arrefecimento em suas
atitudes. E não só pela inclusão de parlamentares e dos dois presidentes das
Casas como beneficiários de supostas propinas, para não citar o constrangedor
episódio dos mamíferos roedores em audiência da CPI da Petrobrás. A deterioração
de seu relacionamento com o Executivo impôs a indicação de um novo coordenador
político, o vice-presidente, que terá sua missão muito facilitada. Há, segundo
os órgãos de imprensa, milhares de cargos de confiança a distribuir em áreas
governamentais. Será um processo de barganha em que predominarão interesses
partidários, ideológicos e até pessoais. Será um voto de cabresto no mais alto
nível. A radicalização política e ideológica e os métodos de aliciamento não
permitirão que o Legislativo seja um toro seco salvador.
O Judiciário, após
o processo do mensalão e, agora, com a Operação Lava Jato, volta a ser a
esperança dos brasileiros, como uma instituição que poderá diminuir a velocidade
deste redemoinho. Integram seus quadros homens honrados - como o juiz federal
Sergio Moro e sua equipe - que não permitirão que este país se
desmantele.
Cabe, contudo, uma
ressalva. O processo jurídico dessa operação deverá ser finalizado no STF. Nas
recentes manifestações populares o nome do ministro Toffoli esteve em evidência,
por uma razão mais que justificada. Sua designação para presidir os julgamentos
da Lava Jato foi considerada uma afronta ao princípio jurídico da isenção. O seu
intestino relacionamento com o PT poderia conduzi-lo a atender a interesses
outros que não os da Justiça. Decepções e frustrações nesses julgamentos
aceleraram a velocidade das águas do redemoinho.
O Executivo atingiu
um patamar negativo de aceitação pelo povo brasileiro e reverter esse quadro não
será fácil. O descrédito observado teve origem na campanha eleitoral da atual
presidente. As promessas e afirmações feitas mostraram-se falsas após sua
eleição, pois o objetivo maior era sua permanência no poder. A mentira, diz a
sabedoria popular, é o maior passo para o descrédito de um chefe, e no Brasil a
atitude de "afastamento" adotada pela presidente agrava o atual quadro de
desgoverno no País. Sua presença em público tem sido evitada, a não ser em atos
e movimentos ditos sociais promovidos por MST e CUT, exércitos do comandante em
chefe, o ex-presidente Lula.
A esperança de um
possível toro seco que venha serenar este crítico momento é o ajuste fiscal
preconizado pelo ministro da Fazenda. Conciliar cortes com o feitio populista de
distribuição de benesses deste governo será o grande desafio. Um amargo remédio
de difícil ingestão.
No momento as
Forças Armadas estão em evidência em razão da surpreendente solicitação de
intervenção militar observada nas manifestações populares de março e abril. Aos
militares da reserva pergunta-se invariavelmente o que farão as Forças Armadas
diante dessa ameaça de desestruturação do País. Por terem vivenciado o período
do regime militar, respondem sem querer polemizar, mas com uma boa dose de
ironia e irreverência: "Nada! Quanto a nós, só estamos observando, sem nos
esquecermos de que, quando veio o Zepelim, fomos a Geni durante 30 anos e não
desejamos mais sê-la!".
De fato, nestes
anos as Forças Armadas e o regime militar foram acusados de malefícios de toda
ordem. Até nos dias atuais os problemas que surgem são creditados à "ditadura
militar". Um modo fácil de fugir de responsabilidades. Mas é interessante
observar que desde a década de 1990 as Forças Armadas estão no topo de
credibilidade junto ao povo brasileiro. Talvez por representarem o oposto da
imoralidade, falsidade e corrupção do momento presente, assinaladas nas
manifestações populares. A melhor resposta militar vem justamente dos três
comandantes das Forças, que asseguram, com clareza e acerto, o respeito integral
aos artigos da nossa Constituição. Um toro seco, provavelmente, não mais serão.
Nas recentes comemorações do Dia do Exército seu comandante declarou com muita
propriedade que a Força Terrestre será sempre democrática, apartidária e
inteiramente dedicada ao serviço da Nação. Com o devido respeito, acrescentaria:
"Sempre vigilante para que regimes espúrios não se apossem de nosso
país".
O redemoinho que
aqui se formou poderá conduzir a Nação a uma instabilidade institucional se
soluções de caráter ideológico, contrárias a um Estado Democrático de Direito,
forem efetivadas, como preconiza o Foro de São Paulo. A adoção de princípios
chavistas-bolivarianos e de uma "democracia" populista e totalitária são claros
objetivos dessa organização gramscista e orientadora do partido que nos
governa.
É por isso que
nossas Forças Armadas - as grandes avalistas da democracia nacional - deverão
estar em perene vigilância, tendo em mente não apenas o lema do marechal Mallet,
mas também o clamor que se fez ouvir em uníssono nas ruas: "Nossa bandeira não é
vermelha, é verde-amarela!".
*Rômulo Bini Pereira é General de
Exército R/1 e foi chefe do Estado-Maior da
Defesa
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