Troca de Religião - Opinião em Tópicos - Julho 2015
A missa e o passe
De passagem, ouvi a conversa entre duas mulheres: “Não, eu agora não estou mais indo à missa. Vou ao centro espírita todas as semanas tomar um passe.”.
Pelo visto, ela havia trocado de religião. Mas, ao que tudo indica, não teria removido as estruturas mentais que sustentam sua visão de homem e de mundo. E aí é que a coisa pega. Trocar de religião implica, quase sempre, na simples busca de novos fatores externos de ajuda para resolver problemas pessoais. Troca-se a eucaristia católica pelo passe espírita, ou este pela unção de óleos sagrados trazidos de Jerusalém por um pastor evangélico. Há, também, quem aposte em se utilizar de todos, ao mesmo tempo. “Mal não faz”, argumentam. “Todas as religiões são boas”, costumam sustentar.
O espiritismo e as religiões
Qualquer um desses recursos, dependendo das crenças e condicionamentos psicológicos internos do indivíduo, pode, sim, fazer bem. Os tarôs, as runas, os incensos e as ervas, também. Nada é condenável. Crença nenhuma é condenável. Como assinalou Durkheim, todas as religiões respondem, ainda que de maneiras diferentes, a determinadas condições da vida humana. E, por isso, ele afirmava que todas eram verdadeiras.
Mas, o espiritismo está fora desse mundo das crenças e dos favores divinos dispensados a seus fiéis. Allan Kardec escreveu que o espiritismo não se dirigia àqueles que tinham sua religião e estavam com ela satisfeitos. Como novo paradigma de conhecimento, seu objetivo era propor, especialmente, uma nova visão de homem, a partir da realidade e da essencialidade do espírito, sua imortalidade, evolução e comunicabilidade, fatores capazes, igualmente, de gerar uma nova visão de Deus, de mundo e de universo.
Troca de religião
Os centros espíritas estão cheios de gente que simplesmente trocou de religião. Adotaram a religião espírita ou a praticam concomitantemente com outras religiões, mas se mantêm distanciados da filosofia espírita que é, justamente, o que o identifica e qualifica.
Antes do que oferecer novos sucedâneos de práticas religiosas àqueles que o buscam, o centro espírita deve estar preparado para demonstrar que o espiritismo se destina a libertá-los dessas práticas. Foi também Kardec quem escreveu, e mais de uma vez, que o espiritismo “é uma questão de fundo e não de forma”. Argumenta-se que através da forma se chegará ao fundo. O problema é que quem privilegia a forma dificilmente terá coragem de dispensá-la para optar pelas questões de fundo. Os centros espíritas – dizem – se esvaziariam.
Templo, hospital ou escola?
A mulher que deixou de ir à missa para, semanal e religiosamente, tomar um passe no centro espírita, provavelmente passe o resta da vida sem se dar conta disso. Mas, é possível, que o maior número de autênticos espíritas esteja lá fora, e não no interior dos assim chamados templos espíritas.
A efetiva vivência espírita se dá no interior e não do exterior. Dispensa, inclusive, a frequência ao centro espírita.
Então, é de se perguntar: mas, essa visão não terminaria por fechar todos, ou a maioria dos centros espíritas?
Negativo, desde que houvesse um esforço de fazer do centro espírita não um templo, não um hospital, não um ambulatório, mas uma escola, um ambiente capaz de estimular o debate de ideias e o aprimoramento das virtudes éticas reclamadas pela condição espiritual e humana, um local de convivência fraterna e solidária. Esses fatores, com certeza, são mais eficientes que o passe ou a água fluidificada. E não criam nenhuma dependência. Libertam.
(Coluna publicada nas edições de julho dos jornais Opinião, do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre e Abertura,do Instituto Cultural Kardecista de Santos)
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