Uma biografia sobre o Brasil feita a quatro mãos
Jornal do Commercio Online - 17/08/2015
Tentar dar conta da complexidade do Brasil não é fácil. Quanto tentaram escrever um livro dando conta da trajetória do país, as historiadoras Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Murgel Starling escolheram não fazer um livro de história, como já existem vários, mas sim uma espécie de biografia da nação. Com quase 700 páginas e 30 mil exemplares vendidos, Brasil: uma Biografia (Companhia das Letras) é lançado nesta segunda (17/8) na Livraria Cultura do Paço Alfândega a partir das 19h, com direito a palestra da dupla.
O projeto surgiu por conta de uma encomenda da Penguin-Companhia das Letras, que queria criar uma obra para ser traduzida e servir de guia também para o público estrangeiro. “Outros autores já tinham desistido da iniciativa por sua dimensão”, conta Lilia. “É um livro muito ousado. Ele tem uma preocupação que não é só evolutiva e cronológica. Cada capítulo debate uma questão da formação do Brasil. Falamos também de grandes personagens e de pequenas figuras. Queríamos mostrar que história também é reflexão”, continua.
Heloisa exemplifica a preferência por personagens anônimos. “Destacamos a história de Zeferina, que comandou a resistência de um quilombo em Salvador. Nós não conhecíamos, foi muito bom poder inserir isso. E tem também uma revolta em Pernambuco, contra um governador corrupto apelidado de Xumberga”, aponta a autora. “Partimos dessa ideia de que o Brasil não é um destino completo. Brinco dizendo que nós duas temos muito afeto pelo personagem da biografia, mas não deixamos, em dados momentos, de ser impiedosas com ele.”
O país é, como reafirma Lilia, um personagem complexo, cheio de contradições, avanços e retornos. Na introdução, ela e Heloisa falam de como a Lei Áurea é um exemplo de que mesmo os avanços não preveem suas consequências e geram retrocessos – o fim tardio da escravidão nunca enfrentou a desigualdade entre raças e racismo que o processo gerou. “Existem aqui grandes estruturas que se repetem sem se alterar, como a grande propriedade, o patrimonialismo, a corrupção social e a questão racial, que é o grande tema de nossa agenda”, ressalta Lilia.
Outra ilusão que a obra tenta desconstruir é de não vivemos em um país violento. “A Guerra do Paraguai já mostrava que não somos pacíficos, mas as muitas revoltas e batalhas atestam isso. A escravidão é uma violência contínua, que foi combatida também. Fizemos uma espécie de arqueologia da violência também: ela não é um acidente por aqui, faz da nossa formação”, atesta Lilia.
O lançamento de Brasil: uma Biografia no Recife não é por acaso: Lilia Schwarcz e Heloisa Starling tentaram escapar da armadilha de construir a narrativa do país centrada no Sudeste. A vinda para o Recife, inclusive, é uma forma de homenagear um historiador importantíssimo para as duas: Evaldo Cabral de Mello. “Ele é um dos nosso maiores autores, porque no ensina a enxergar pelas margens. Mas até brinco com ele que não posso reverenciar muito Pernambuco, porque se não ele se gaba em Minas Gerais, minha terra”, diverte-se Heloisa.
O volume chega a comentar até as manifestações que pediam o impeachment de Dilma, em março deste ano. “Historiador não costuma falar muito do presente, mas acho que o presidencialismo de coalizão está esgotado, mas o futuro ainda não está preparado. A democracia evoluiu nos últimos anos, mas o nosso projeto de república está inconcluso – a república chegou, mas não os valores republicanos”, analisa Heloisa.
O projeto surgiu por conta de uma encomenda da Penguin-Companhia das Letras, que queria criar uma obra para ser traduzida e servir de guia também para o público estrangeiro. “Outros autores já tinham desistido da iniciativa por sua dimensão”, conta Lilia. “É um livro muito ousado. Ele tem uma preocupação que não é só evolutiva e cronológica. Cada capítulo debate uma questão da formação do Brasil. Falamos também de grandes personagens e de pequenas figuras. Queríamos mostrar que história também é reflexão”, continua.
Heloisa exemplifica a preferência por personagens anônimos. “Destacamos a história de Zeferina, que comandou a resistência de um quilombo em Salvador. Nós não conhecíamos, foi muito bom poder inserir isso. E tem também uma revolta em Pernambuco, contra um governador corrupto apelidado de Xumberga”, aponta a autora. “Partimos dessa ideia de que o Brasil não é um destino completo. Brinco dizendo que nós duas temos muito afeto pelo personagem da biografia, mas não deixamos, em dados momentos, de ser impiedosas com ele.”
O país é, como reafirma Lilia, um personagem complexo, cheio de contradições, avanços e retornos. Na introdução, ela e Heloisa falam de como a Lei Áurea é um exemplo de que mesmo os avanços não preveem suas consequências e geram retrocessos – o fim tardio da escravidão nunca enfrentou a desigualdade entre raças e racismo que o processo gerou. “Existem aqui grandes estruturas que se repetem sem se alterar, como a grande propriedade, o patrimonialismo, a corrupção social e a questão racial, que é o grande tema de nossa agenda”, ressalta Lilia.
Outra ilusão que a obra tenta desconstruir é de não vivemos em um país violento. “A Guerra do Paraguai já mostrava que não somos pacíficos, mas as muitas revoltas e batalhas atestam isso. A escravidão é uma violência contínua, que foi combatida também. Fizemos uma espécie de arqueologia da violência também: ela não é um acidente por aqui, faz da nossa formação”, atesta Lilia.
O lançamento de Brasil: uma Biografia no Recife não é por acaso: Lilia Schwarcz e Heloisa Starling tentaram escapar da armadilha de construir a narrativa do país centrada no Sudeste. A vinda para o Recife, inclusive, é uma forma de homenagear um historiador importantíssimo para as duas: Evaldo Cabral de Mello. “Ele é um dos nosso maiores autores, porque no ensina a enxergar pelas margens. Mas até brinco com ele que não posso reverenciar muito Pernambuco, porque se não ele se gaba em Minas Gerais, minha terra”, diverte-se Heloisa.
O volume chega a comentar até as manifestações que pediam o impeachment de Dilma, em março deste ano. “Historiador não costuma falar muito do presente, mas acho que o presidencialismo de coalizão está esgotado, mas o futuro ainda não está preparado. A democracia evoluiu nos últimos anos, mas o nosso projeto de república está inconcluso – a república chegou, mas não os valores republicanos”, analisa Heloisa.
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