JULHO20
A escola que Rubem Alves sonhou
Por *Cláudia Santa Rosa
Começo da tarde, terceiro sábado de julho, 2014. A notícia: “O escritor
e educador Rubem Alves morreu aos 80 anos”. Pensei: partiu o homem pássaro para
fazer, não sei, talvez o seu último voo, um voo para o infinito. Logo a notícia
se espalhou nas redes sociais e com ela, de forma surpreendente, inúmeras
homenagens: fragmentos de textos do poeta, do educador, do homem da palavra.
Fiquei tentada a postar algo bonito, escrito por ele, mas preferi silenciar e
refletir.
Tenho uma certeza: por mais que o lado ácido da academia ainda
não tenha dado a devida atenção à obra sensível de Rubem Alves, o Brasil perdeu
um dos seus educadores e pensadores mais brilhantes, do nível de Anísio Teixeira
e Paulo Freire, apenas para citar esses dois ícones.
Aproximei-me da obra
de Rubem Alves somente em 2003, quando decidi que pesquisaria a Escola da Ponte
para defender a minha tese de doutorado em educação. Li muitos textos, sobretudo
artigos, contos e crônicas. Fui ouvi-lo em encontros de educação e literários. O
seu jeito fascinante de prender o leitor repetia-se nas palestras, simplesmente
encantador.
“A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse
existir”, o livro de Rubem Alves que esperei pouco mais de dois anos para lê-lo.
Um verdadeiro poema sobre a educação libertadora, escrito a partir do seu
encontro com a Escola da Ponte. Sim, evitei ler o Rubem antes de realizar a
pesquisa. Temia me deixar guiar pelo jeito que ele viu aquela escola,
surpreendentemente singular. Recordo-me as muitas vezes em que olhei para o
livro e tanto o desejei. Era uma atração movida pela curiosidade, pela
descoberta do que tanto ele teria dito. Lembrei-me da protagonista de
“Felicidade Clandestina”, o texto magistral de Clarice Lispector.
Estava
em campo fazia pouco mais de três meses. Senti-me preparada e, finalmente, li o
livro. Na verdade degustei cada ideia, estudei enriquecida pela realidade que
agora eu conhecia. Lá estavam crônicas de encantamento, metáforas perfeitas,
numa bela costura de teorização da escola dos seus sonhos. Rubem Alves contou,
com os olhos de pássaro, o que/como viu na/a Escola da Ponte.
Assim como
foi para ele, revelação registrada na página 31 do livro, a Ponte também foi
para mim “uma experiência de iluminação”. Em seguida, afirmou: “Minha grande
paixão é a educação. Não posso me conformar com os absurdos que perpassam nossas
rotinas escolares: o sofrimento das crianças, a perda de tempo, os esforços
desnecessários, os esforços inúteis, os esforços absurdos (...)”. Ora, a
improdutividade das nossas escolas é de uma agressão sem limites à tolerância de
um educador minimamente comprometido com a educação de crianças e
jovens.
Avessa às práticas escolares inspiradas na linha de montagem de
fábrica, a Escola da Ponte há mais de 35 anos aposta na pessoalidade, em
crianças e jovens com interesses, necessidades e objetivos de aprendizagens
únicos. Rubem Alves evocou o processo artesanal – que dispensa modelos,
padronizações – para descrever o jeito de trabalhar e aprender pontista,
consubstanciado pela “disciplina, concentração, alegria e eficiência”.
O
que mais dizer de uma escola que rompeu com todos os paradigmas hegemônicos? A
Ponte assim se fez, por entender que era necessário respeitar as crianças e os
jovens. Aboliu paredes, a sala de aula, a aula, o professor solitário com os
alunos, a turma, o diário de classe, o toque, o livro de ponto, a sala dos
professores, a mesa do professor, as carteiras ou mesas individuais, as provas,
o planejamento diário do professor. Aboliu os corriqueiros pedidos de silêncio,
o castigo, a exclusão.
A Ponte construiu os seus próprios dispositivos
pedagógicos. É única, singular, porque entende que tem que ser assim. A Escola
da Ponte é mais do que um prédio, do que uma instituição de ensino. É um projeto
de formação de pessoas fraternas, solidárias, autônomas, responsáveis,
competentes, cidadãs, do modo como sonhara Rubem Alves.
Como diz sempre o
José Pacheco, o seu idealizador, a “Escola da Ponte mostrou que a utopia é
realizável”. E é! Rubem Alves viu com os seus olhos de pássaro. Fátima, Celso,
Júlio, Rosely, Ricardo, Alexandre, Carla, Jane, Thais, Gabriela, Ana Lúcia...
muitos viram que é possível. Eu também vi!
*Educadora e Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da
Educação – IDE ( educadora@claudiasantarosa.com )
Por *Cláudia Santa Rosa
Começo da tarde, terceiro sábado de julho, 2014. A notícia: “O escritor e educador Rubem Alves morreu aos 80 anos”. Pensei: partiu o homem pássaro para fazer, não sei, talvez o seu último voo, um voo para o infinito. Logo a notícia se espalhou nas redes sociais e com ela, de forma surpreendente, inúmeras homenagens: fragmentos de textos do poeta, do educador, do homem da palavra. Fiquei tentada a postar algo bonito, escrito por ele, mas preferi silenciar e refletir.
Tenho uma certeza: por mais que o lado ácido da academia ainda não tenha dado a devida atenção à obra sensível de Rubem Alves, o Brasil perdeu um dos seus educadores e pensadores mais brilhantes, do nível de Anísio Teixeira e Paulo Freire, apenas para citar esses dois ícones.
Aproximei-me da obra de Rubem Alves somente em 2003, quando decidi que pesquisaria a Escola da Ponte para defender a minha tese de doutorado em educação. Li muitos textos, sobretudo artigos, contos e crônicas. Fui ouvi-lo em encontros de educação e literários. O seu jeito fascinante de prender o leitor repetia-se nas palestras, simplesmente encantador.
“A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir”, o livro de Rubem Alves que esperei pouco mais de dois anos para lê-lo. Um verdadeiro poema sobre a educação libertadora, escrito a partir do seu encontro com a Escola da Ponte. Sim, evitei ler o Rubem antes de realizar a pesquisa. Temia me deixar guiar pelo jeito que ele viu aquela escola, surpreendentemente singular. Recordo-me as muitas vezes em que olhei para o livro e tanto o desejei. Era uma atração movida pela curiosidade, pela descoberta do que tanto ele teria dito. Lembrei-me da protagonista de “Felicidade Clandestina”, o texto magistral de Clarice Lispector.
Estava em campo fazia pouco mais de três meses. Senti-me preparada e, finalmente, li o livro. Na verdade degustei cada ideia, estudei enriquecida pela realidade que agora eu conhecia. Lá estavam crônicas de encantamento, metáforas perfeitas, numa bela costura de teorização da escola dos seus sonhos. Rubem Alves contou, com os olhos de pássaro, o que/como viu na/a Escola da Ponte.
Assim como foi para ele, revelação registrada na página 31 do livro, a Ponte também foi para mim “uma experiência de iluminação”. Em seguida, afirmou: “Minha grande paixão é a educação. Não posso me conformar com os absurdos que perpassam nossas rotinas escolares: o sofrimento das crianças, a perda de tempo, os esforços desnecessários, os esforços inúteis, os esforços absurdos (...)”. Ora, a improdutividade das nossas escolas é de uma agressão sem limites à tolerância de um educador minimamente comprometido com a educação de crianças e jovens.
Avessa às práticas escolares inspiradas na linha de montagem de fábrica, a Escola da Ponte há mais de 35 anos aposta na pessoalidade, em crianças e jovens com interesses, necessidades e objetivos de aprendizagens únicos. Rubem Alves evocou o processo artesanal – que dispensa modelos, padronizações – para descrever o jeito de trabalhar e aprender pontista, consubstanciado pela “disciplina, concentração, alegria e eficiência”.
O que mais dizer de uma escola que rompeu com todos os paradigmas hegemônicos? A Ponte assim se fez, por entender que era necessário respeitar as crianças e os jovens. Aboliu paredes, a sala de aula, a aula, o professor solitário com os alunos, a turma, o diário de classe, o toque, o livro de ponto, a sala dos professores, a mesa do professor, as carteiras ou mesas individuais, as provas, o planejamento diário do professor. Aboliu os corriqueiros pedidos de silêncio, o castigo, a exclusão.
A Ponte construiu os seus próprios dispositivos pedagógicos. É única, singular, porque entende que tem que ser assim. A Escola da Ponte é mais do que um prédio, do que uma instituição de ensino. É um projeto de formação de pessoas fraternas, solidárias, autônomas, responsáveis, competentes, cidadãs, do modo como sonhara Rubem Alves.
Como diz sempre o José Pacheco, o seu idealizador, a “Escola da Ponte mostrou que a utopia é realizável”. E é! Rubem Alves viu com os seus olhos de pássaro. Fátima, Celso, Júlio, Rosely, Ricardo, Alexandre, Carla, Jane, Thais, Gabriela, Ana Lúcia... muitos viram que é possível. Eu também vi!
*Educadora e Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da Educação – IDE ( educadora@claudiasantarosa.com )
A escola que Rubem Alves sonhou
Por *Cláudia Santa Rosa
Começo da tarde, terceiro sábado de julho, 2014. A notícia: “O escritor e educador Rubem Alves morreu aos 80 anos”. Pensei: partiu o homem pássaro para fazer, não sei, talvez o seu último voo, um voo para o infinito. Logo a notícia se espalhou nas redes sociais e com ela, de forma surpreendente, inúmeras homenagens: fragmentos de textos do poeta, do educador, do homem da palavra. Fiquei tentada a postar algo bonito, escrito por ele, mas preferi silenciar e refletir.
Tenho uma certeza: por mais que o lado ácido da academia ainda não tenha dado a devida atenção à obra sensível de Rubem Alves, o Brasil perdeu um dos seus educadores e pensadores mais brilhantes, do nível de Anísio Teixeira e Paulo Freire, apenas para citar esses dois ícones.
Aproximei-me da obra de Rubem Alves somente em 2003, quando decidi que pesquisaria a Escola da Ponte para defender a minha tese de doutorado em educação. Li muitos textos, sobretudo artigos, contos e crônicas. Fui ouvi-lo em encontros de educação e literários. O seu jeito fascinante de prender o leitor repetia-se nas palestras, simplesmente encantador.
“A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir”, o livro de Rubem Alves que esperei pouco mais de dois anos para lê-lo. Um verdadeiro poema sobre a educação libertadora, escrito a partir do seu encontro com a Escola da Ponte. Sim, evitei ler o Rubem antes de realizar a pesquisa. Temia me deixar guiar pelo jeito que ele viu aquela escola, surpreendentemente singular. Recordo-me as muitas vezes em que olhei para o livro e tanto o desejei. Era uma atração movida pela curiosidade, pela descoberta do que tanto ele teria dito. Lembrei-me da protagonista de “Felicidade Clandestina”, o texto magistral de Clarice Lispector.
Estava em campo fazia pouco mais de três meses. Senti-me preparada e, finalmente, li o livro. Na verdade degustei cada ideia, estudei enriquecida pela realidade que agora eu conhecia. Lá estavam crônicas de encantamento, metáforas perfeitas, numa bela costura de teorização da escola dos seus sonhos. Rubem Alves contou, com os olhos de pássaro, o que/como viu na/a Escola da Ponte.
Assim como foi para ele, revelação registrada na página 31 do livro, a Ponte também foi para mim “uma experiência de iluminação”. Em seguida, afirmou: “Minha grande paixão é a educação. Não posso me conformar com os absurdos que perpassam nossas rotinas escolares: o sofrimento das crianças, a perda de tempo, os esforços desnecessários, os esforços inúteis, os esforços absurdos (...)”. Ora, a improdutividade das nossas escolas é de uma agressão sem limites à tolerância de um educador minimamente comprometido com a educação de crianças e jovens.
Avessa às práticas escolares inspiradas na linha de montagem de fábrica, a Escola da Ponte há mais de 35 anos aposta na pessoalidade, em crianças e jovens com interesses, necessidades e objetivos de aprendizagens únicos. Rubem Alves evocou o processo artesanal – que dispensa modelos, padronizações – para descrever o jeito de trabalhar e aprender pontista, consubstanciado pela “disciplina, concentração, alegria e eficiência”.
O que mais dizer de uma escola que rompeu com todos os paradigmas hegemônicos? A Ponte assim se fez, por entender que era necessário respeitar as crianças e os jovens. Aboliu paredes, a sala de aula, a aula, o professor solitário com os alunos, a turma, o diário de classe, o toque, o livro de ponto, a sala dos professores, a mesa do professor, as carteiras ou mesas individuais, as provas, o planejamento diário do professor. Aboliu os corriqueiros pedidos de silêncio, o castigo, a exclusão.
A Ponte construiu os seus próprios dispositivos pedagógicos. É única, singular, porque entende que tem que ser assim. A Escola da Ponte é mais do que um prédio, do que uma instituição de ensino. É um projeto de formação de pessoas fraternas, solidárias, autônomas, responsáveis, competentes, cidadãs, do modo como sonhara Rubem Alves.
Como diz sempre o José Pacheco, o seu idealizador, a “Escola da Ponte mostrou que a utopia é realizável”. E é! Rubem Alves viu com os seus olhos de pássaro. Fátima, Celso, Júlio, Rosely, Ricardo, Alexandre, Carla, Jane, Thais, Gabriela, Ana Lúcia... muitos viram que é possível. Eu também vi!
*Educadora e Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da Educação – IDE ( educadora@claudiasantarosa.com )
Uma passagem marcante. Um homem brilhante. Uma inspiração recorrente. Uma obra genial. Uma luz no fim do túnel. Foi, e, o mais impressionante é que ficou para sempre. Talvez sua passagem sirva para que sua obra toque aqueles que não a conheciam, para que sua ousadia seja uma marca para futuros posicionamentos, para que sua voz se propague em cada escola e que sua luta por uma educação revolucionária não morra nunca. Nosso luto tem que ser ação.
ResponderExcluirQue bom que o Rubem passou em minha vida e na de meus estudantes e deixou tantas marcas.
Beijos no coração de todos.
Leísa Sasso