terça-feira, 22 de setembro de 2015

UM GESTO DE AMOR.

Contadores de histórias alegram pequenos pacientes em hospitais

G1 - 12/09/2015

Os livros seguem de bicicleta na maior cidade do país. O projeto é movido por uma realidade preocupante: o retrato mais recente da leitura no Brasil revela um quadro dramático. O número de leitores está diminuindo. A redução chega a sete milhões de leitores em quatro anos. E quem lê está lendo menos.

O brasileiro lê em média quatro livros por ano. Metade do que se lê em Portugal.

“O principal motivo para não ler é desinteresse e falta de tempo. Sem dúvida, não é o preço do livro que te afasta do livro, tanto que se você comparar preço do livro com o que você gasta com celular, com uso de canais a cabo, com tênis. As pessoas têm que perceber a importância do livro”, disse Zoara Failla, do Instituto Pró-Livro.

“Eu vejo muitas bibliotecas com um novo enfoque, atraindo os leitores, não é mais aquela biblioteca silenciosa. A biblioteca infantil, ela é colorida, com almofadas, tem a contação de história”, contou a escritora Luciana Sandroni.

Nada contra as bibliotecas tradicionais. Tão úteis, tão importantes. É que uma biblioteca como a Parque Estadual, no Rio de Janeiro, é informal. Cativa mais o novo leitor. Além de emprestar os livros, a biblioteca tem cursos, oficinas, exposição. Um lugar vivo, pra ser muito frequentado.

Lá vai a biblioteca ambulante pelas ruas de São Paulo. É a bicicloteca. Há várias espalhadas por aí, como a do Rafael. Ele começou montando uma estante de livros na empresa dele, de motoboys. A leitura conquistou os funcionários. Muitos voltaram a estudar.

“Tem motoboy que virou atendente, tem motoboy que saiu daqui pra virar vendedor nas ruas. O retorno é o crescimento profissional e pessoal da pessoa”, disse o empresário Rafael Bernardes.

Marcos foi promovido a gerente comercial. E agradece ter despertado para a leitura.

“Ajudou, acho, que 90%. O outro é a força de vontade, mas a leitura muda, eu creio que a leitura muda uma pessoa, muda um país”, opinou Marcos de Souza Santos, gerente comercial.

Quando as doações já não cabiam mais nas estantes, Rafael pôs a biblioteca em ação.

Acesso ao livro: Tem muitos de preço baixo nas bancas de jornais. E tem livro de graça em casinhas instaladas em vários pontos do Rio de Janeiro – até na beira da praia. Tem um ninho de livro bem pertinho do trabalho da Silvia Freire. Ela é ascensorista de um prédio em Copacabana. Está sempre lendo - até em serviço. Com permissão do síndico. Quando termina um livro, lá vai ela pegar outro.

No ninho de livros, uma coleção completa de personagens que mudaram o mundo. Livros em inglês.

“A rotatividade de livros ela existe. Existe também o sentimento de pertencimento, onde as pessoas cuidam, as pessoas nos procuram dizendo: ‘Olha, a casinha de tal bairro está danificada. Será que vocês não podem cuidar?’”, contou Myrtes Mattos, criadora do Ninho de Livros.

Os ninhos chegaram em agosto de 2015 a Fortaleza. E o plano é se espalharem pelo Brasil, com o apoio das prefeituras.

Contadores de histórias alegram vida de pequenos pacientes em hospitais

No Instituto Fernandes Figueira, no Rio de Janeiro, quem está doente é recebido com histórias. A cena se repete por todo o hospital. No ambulatório, a espera por atendimento é amenizada pela leitura.

“Esse é um ambiente muito especial, porque antes as mães ficavam muito sem saber o que fazer”, explica Madalena Oliveira, a Madá - e não só pros íntimos. É assim que todo mundo chama a coordenadora do projeto de leitura. Ela foi para ficar um mês. E lá se vão 17 anos.

O que chama atenção na Madá é que ela sobe e desce andar, entra nas enfermarias e ela sabe o nome de todas as crianças. A maioria dos pequenos pacientes - e dos pais dos pequenos pacientes - não tinha contato com o livro até chegar lá.

“Teve um pai, passei por ele e ele disse: ‘Ela é que é culpada’, mas falou pra mulher dele. Eu disse: ‘Eu sou culpada por quê?’ ‘Porque agora todo dia eu tenho que ler história pra minha filha.’ Esse é o retorno que a gente recebe”, contou Madá.

Madá formou um exército de voluntários que estão sempre por perto. Gente que doa tempo para espalhar a leitura. Mesmo em momentos muito difíceis.

Ela é conhecida. Onde chega as crianças reconhecem e elas ficam esperando os livros. A Camilly, que chegou há três meses, pede três livros por dia. O tempo de internação ela passa fazendo as unhas e lendo, lendo muito. Hábito que adquiriu com as voluntárias da Madá.

Os pequenininhos, até os bebezinhos, também têm direito a livros e leitura. Sophie tem quatro meses. De início, dá a impressão de que ela nem repara na contação de história. Mas é só baixar o livro para ela pedir mais – com os olhos.

Mateus viveu muitos anos no hospital por causa de uma doença nos pulmões. Aos quatro anos e dez meses, ele foi dar um passeio na rua com a Madá. O primeiro passeio desde bebê. E foi um exagero de boas emoções.

“Era um céu de outono e tinha uma nuvem só no céu e eu mostrei pra ele: ‘Olha, Mateus, a nuvem’. Ele me perguntou: ‘Quem desenhou?’ Ele só conhecia as nuvens através dos livros. O que a gente lê, o que a gente deixa para as crianças, ninguém vai poder tirar delas. É isso que eu acredito, é a grande herança que a gente pode deixar”, disse Madá

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