TRISTE, PATÉTICO, INSIPIENTE E
INÓSPITO JUDICIÁRIO
MARCO ANTONIO
VILLA -
historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos
(SP).
O Superior Tribunal de Justiça (STJ)
é formado por 33 ministros. Foi criado pela Constituição de
1988. Poucos conhecem ou acompanham sua atuação, pois as atenções nacionais
estão concentradas no Supremo Tribunal Federal. No site oficial
está escrito que é o tribunal da cidadania. Será?
Um simples
passeio pelo site permite obter algumas informações
preocupantes.
O tribunal tem 160
veículos, dos quais 112 são automóveis e os restantes
48 são vans, furgões e ônibus. É difícil entender as razões de
tantos veículos para um simples tribunal. Mais estranho é o número de
funcionários. São 2.741 efetivos.
Muitos, é inegável. Mas o
número total é maior ainda. Os terceirizados representam 1.018.
Desta forma, um simples tribunal tem 3.759 funcionários, com a
média aproximada de mais de uma centena de trabalhadores por
ministro!! Mesmo assim, em um só contrato, sem licitação, foram
destinados quase R$ 2 milhões para serviço de
secretariado.
Não é por falta de recursos que os
processos demoram tantos anos para serem julgados. Dinheiro
sobra. Em 2010, a dotação orçamentária foi de R$ 940
milhões. O dinheiro foi mal gasto. Só para comunicação e divulgação
institucional foram reservados R$ 11milhões, para assistência
médica a dotação foi de R$ 47 milhões e mais 45 milhões
de auxílio-alimentação. Os funcionários devem viver com muita sede,
pois foram destinados para compra de água mineral R$ 170 mil. E
para reformar uma cozinha foram gastos R$ 114 mil. Em um acesso
digno de Oswaldo Cruz, o STJ consumiu R$ 225 mil em vacinas. À
conservação dos jardins — que, presumo, devem estar muito bem conservados — o
tribunal reservou para um simples sistema de irrigação a módica
quantia de R$ 286 mil.
Se o passeio pelos gastos do tribunal
é aterrador, muito pior é o cenário quando analisamos a folha de pagamento. O STJ fala em
transparência, porém não discrimina o nome dos ministros e
funcionários e seus salários. Só é possível saber que um ministro
ou um funcionário (sem o respectivo nome) recebeu em certo mês um determinado
salário bruto. E só. Mesmo assim, vale muito a pena pesquisar as folhas de
pagamento, mesmo que nem todas, deste ano, estejam disponibilizadas. A média
salarial é muito alta. Entre centenas de funcionários efetivos é muito difícil
encontrar algum que ganhe menos de 5 mil reais.
Mas o que
chama principalmente a atenção, além dos salários, são os ganhos eventuais, denominação que o tribunal
dá para o abono, indenização e antecipação das férias, a antecipação e a
gratificação natalinas, pagamentos retroativos e serviço extraordinário e
substituição. Ganhos rendosos. Em março deste ano um ministro
recebeu, neste item, 169 mil reais. Infelizmente há outros dois que
receberam quase que o triplo: um recebeu R$ 404 mil; e outro, R$ 435
mil. Este
último, somando o salário e as vantagens pessoais, auferiu quase
meio milhão de reais em
apenas um mês!
Os outros dois foram “menos aquinhoados”, um ficou com R$ 197 mil e o segundo, com 432 mil.
A situação foi
muito mais grave em setembro.
Neste mês, seis ministros receberam salários
astronômicos: variando de R$ 190 mil a R$ 228
mil.
Os
funcionários (assim como os ministros) acrescem ao salário (designado,
estranhamente, como “remuneração
paradigma”)
também as “vantagens
eventuais”, além das
vantagens pessoais e outros auxílios (sem esquecer as diárias). Assim, não é incomum um funcionário
receber R$ 21 mil, como
foi o caso do assessor-chefe CJ-3, do ministro 19, os R$ 25,8 mil do assessor-chefe CJ-3 do
ministro 22,
ou, ainda, em setembro, o assessor chefe CJ-3 do do desembargador 1
recebeu R$ 39 mil (seria cômico se não fosse trágico:
até parece identificação do seriado “Agente 86”).
Em meio a estes
privilégios, o STJ deu outros péssimos exemplos. Em 2010, um ministro,
Paulo
Medina,
foi acusado de vender sentenças judiciais. Foi condenado pelo
CNJ. Imaginou-se que seria preso por ter violado a lei sob a proteção
do Estado, o que é ignóbil. Não, nada disso. A pena foi a aposentadoria
compulsória.
Passou a receber R$ 25 mil. E que pode ser extensiva à
viúva como pensão. Em outubro do mesmo ano, o presidente do STJ,
Ari Pargendler, foi
denunciado pelo estudante Marco Paulo dos Santos. O estudante, estagiário no STJ,
estava num a fila de um caixa eletrônico da agência do Banco do Brasil existente
naquele tribunal. Na frente dele estava o presidente do STJ. Pargendler, aos
gritos, exigiu que o rapaz ficasse distante dele, quando já estava aguardando,
como todos os outros clientes, na fila regulamentar. O presidente daquela Corte
avançou em direção ao estudante, arrancou o seu crachá e
gritou: “Sou presidente
do STJ e você está demitido. Isso aqui acabou para você.” E cumpriu a ameaça. O estudante, que
dependia do estágio — recebia R$ 750 —, foi sumariamente demitido.
Certamente
o STJ vai argumentar que todos os gastos e privilégios são legais. E devem ser.
Mas são imorais, dignos
de uma república bufa. Os ministros deveriam ter vergonha
de receber 30, 50 ou
até 480 mil reais por mês. Na verdade devem achar que é uma
intromissão indevida examinar seus gastos. Muitos, inclusive, podem até usar o
seu poder legal para coagir os críticos. Triste Judiciário. Depois de tanta luta para o
estabelecimento do estado de direito, acabou confundindo independência
com a gastança irresponsável de recursos públicos, e autonomia com prepotência.
Deixou de lado a razão da sua existência: fazer justiça.
MARCO ANTONIO
VILLA é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos
(SP).
UM ARTIGO DESTE QUILATE ACABA
COM QUALQUER ESPERANÇA DE VIVERMOS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.
QUANDO A
JUSTIÇA É DESACREDITADA ESTAMOS NUM FIM DE UMA ERA. ALGUMA COISA VAI
ACONTECER.
POBRE PAÍS. POBRE POVO ENGANADO PELA DEMAGOGIA E POR LADRÕES
DA COISA PÚBLICA.
PARABÉNS PELA CORAGEM MORAL PROFESSOR ANTÔNIO
VILLA.
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