Coluna no GLOBO - Miriam
Leitão
Ao lado de Armando Monteiro Neto, da elite nordestina, o
ex-presidente Lula reciclou seu surrado discurso e disse que os ricos perseguem
o PT. Depois de 11 anos e meio de um governo que alargou os canais de
transferência de dinheiro público para os grandes grupos empresariais, essa
conversa de Lula não se sustenta nos dados e nos fatos. Mas é o que ele dirá
para ver se cola.
A outra parte do discurso que Lula reapresentou no último fim de
semana é mais nefasta. É a ideia de que estudar atrapalha, torna a pessoa
insensível e deseduca. “Comeram demais, estudaram demais e perderam a educação”,
disse o ex-presidente em um dos vários ataques aos
estudos.
A maioria do país condena a forma desrespeitosa com que a presidente
Dilma foi tratada no estádio Itaquerão. Há formas aceitáveis de demonstrar
desagrado ao governo, aquela que foi usada no estádio não faz bem ao país, à
democracia e desrespeita a instituição da Presidência da República. Merece
repúdio.
Isso não dá à campanha da presidente licença para reutilizar todos os
velhos truques das falsas dicotomias que são uma agressão à inteligência alheia.
O governo do PT favoreceu grandes grupos, corporações e os muito ricos através
de subsídios, participações acionárias do Estado em empresas familiares e a
concentração de empréstimos subsidiados às grandes empresas. Isso foi visto em
bases diárias. É um atentado aos fatos dizer que são os ricos que estão contra o
PT.
O pior do discurso do ex-presidente Lula, já conhecido de outras
campanhas, é a sistemática acusação ao estudo, aos diplomas. Ele ataca as
pessoas “que estudaram mais”, mas isso tem pouca importância para cada pessoa em
si. É deletério ao coletivo porque enfraquece o fortalecimento do valor da
educação como parte do processo de construção da prosperidade pessoal e do
país.
Não há área onde estejamos mais atrasados, por erros que vêm de muito
tempo, do que na educação. Nem há setor que no mundo atual seja mais importante
para avançarmos. Por isso, o ex-presidente Lula deveria abandonar a compulsão
que manteve durante o período que governou o país e, agora, que tenta reeleger o
partido pelo quarto mandato, de desqualificar a educação formal, porque dela
precisamos muito.
Em 2010, num discurso durante a campanha da atual presidente Dilma,
Lula foi sincero e disse que “as pessoas ricas foram as que mais ganharam
dinheiro no meu governo”. Em 2006, ele já havia dito a um grupo de repórteres,
com os quais viajou durante a campanha, que “os ricos ganharam muito dinheiro no
meu governo”. De fato, basta ver como o BNDES tratou os maiores grupos
empresariais nessa mistura infalível que anula os riscos e catapulta os ganhos:
o banco vira sócio, compra debêntures lançadas por um grupo, para que ele,
capitalizado, compre outras empresas. Em seguida, empresta dinheiro à empresa a
juros menores do que os pagos pelo Tesouro. Para financiar essa farra o Tesouro
se endividou em R$ 400 bilhões no mercado.
Foram os grandes grupos que pegaram as maiores parcelas desses
recursos. Foram as grandes empreiteiras as beneficiadas com as obras cujo valor
inicial foi sendo aumentado pelos aditivos. Num dos casos, a Refinaria Abreu e
Lima, houve tantas estripulias que um dos responsáveis está na cadeia, pelo
temor de que ele fuja atrás do dinheiro que depositou em suas contas fora do
país.
Basta um olhar nos grandes financiadores do PT para desmentir a ideia
de que só os pobres apoia o partido. Mas esse é um discurso conveniente até
porque os ricos sabem o quanto ganharam e não se importam com essa contradição
entre fala e fatos. O que realmente o ex-presidente deveria evitar é dizer que
estudar é o caminho para a insensibilidade, para a grosseria que foi feita no
estádio, para os maus modos. Essa defesa da falta de ensino escolar esteve
presente em cada palanque que subiu ao longo dos anos que governou e nas
campanhas que fez. Essa é a pior forma de prejudicar o
país.
Se quiser, Lula continue com sua estratégia de acusar ricos, cercado
de ricos; que ponha a culpa na imprensa pelas revelações sobre os escândalos em
série no governo ou na base de apoio, mas poupe a escola do seus ataques. O que
o país mais precisa é de valorizar a educação, a escola, o estudo como parte do
futuro que precisamos alcançar.
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