Encaminhando mais matéria para reflexão, recebida de mão amiga. Porque a
indiferença é pecado ético.
Abraço fraterno.
José Pacheco
Abraço fraterno.
José Pacheco
Neste carnaval, um criminoso internacional
estará na Sapucaí. Não se trata de um traficante de drogas, de um bicheiro, de
ex-diretor da Petrobras e nem de um comerciante de armas. O homem mais perigoso
deste desfile em 2015 estará na ala VIP do Sambódromo, tratado como um rei.
Afinal, foi ele quem alugou uma das escolas de samba mais tradicionais do
Brasil, comprou o samba-enredo e vestiu o grupo para servir de plataforma para
apresentar ao mundo as belezas de seu país.
Teodoro Obiang, ditador da Guiné
Equatorial, pagou 3 milhões de euros para a Beija Flor esquecer qualquer moral,
ética e decência e transformar seu desfile em uma homenagem a um país que é o
símbolo da destruição de uma sociedade por seus líderes.
Na verdade, não foi Obiang quem pagou pela
fantasia. O dinheiro veio de seus miseráveis cidadãos, que jamais foram
questionados se estavam de acordo com a iniciativa. Na verdade, há anos que
ninguém os consulta para absolutamente nada.
Fantasiado de estadista, Obiang estará com
sua delegação oficial de ministros, laranjas e opressores na avenida. Ele já
havia sediado a Copa da África e vem fazendo esforços internacionais para
mostrar ao mundo a "real imagem" de seu país. O Carnaval, portanto, faz parte
dessa estratégia.
É verdade. A compra de um samba-enredo não
é exclusividade da Guiné. Em 2003, Hugo Chavez bancou a escola campeã do
Carnaval do Rio, com uma homenagem à América Latina. Neste ano, os suíços também
pagaram milhões para "inspirar" o samba da Unidos da Tijuca, a atual campeã. Na
letra, paga também com a ajuda de bancos, nenhuma menção a contas secretas da
Petrobras na Suíça e do fato de seu sistema financeiro ser o verdadeiro
Lava-Jato do mundo.
Mas nada se compara ao serviço que a Beija
Flor prestará a um governo que reprime a voz de qualquer dissidente. Neste fim
de semana, o bumbo da escola vai ajudar a silenciar qualquer grito desesperado
de ajuda que possa vir da Guine. Unamuno já dizia: "cuidado, as ditaduras também
fazem belas canções".
Lado B - Mas talvez os foliões queiram
saber quem é exatamente a pessoa que está financiando aquela fantasia que, com
um sorriso no rosto, o carioca vai desfilar com orgulho.
O samba-enredo que fala das belezas
naturais do país e das qualidades de um povo que faço questão de apresentar
aqui, sem serpentina.
Moradores
nas ruas de um bairro pobre no centro de Malabo, na Guiné Equatorial. Junho de
2011. Foto: AFP
Obiang chegou ao poder em 1979, em um
sangrento golpe de estado em que tirou da presidência seu próprio tio. Hoje, ele
é o presidente africano com mais anos no poder, superando até mesmo Robert
Mugabe do Zimbábue e sem previsão de deixar o cargo.
Pena que os autores do enredo não tiveram
acesso aos dados sociais da Guine que o Banco Mundial apresenta sempre que vai
tratar da ex-colônia espanhola. Com apenas 720 mil pessoas, o minúsculo país
enriqueceu graças ao descobrimento de petróleo.
Na verdade, o país não enriqueceu. Quem
enriqueceu foi a família Obiang e seus amigos. Levando em consideração a divisão
da riqueza do país de forma igualitária a todos, a Guine teria um PIB per capta
médio de US$ 22 mil, superando o Brasil
O problema é que esse dinheiro jamais
chegou à população. Mais de dois terços dos cidadãos vivem com uma renda de
menos de US$ 1,00 por dia. Quase 90% das pessoas não tem acesso à Internet e a
expectativa de vida é de apenas 53 anos, o equivalente ao que existia na Europa
há quase 200 anos.
O governo destina 0,6% de seu PIB para a
educação e 20% das crianças estão em um estado de desnutrição
profundo.
Confisco - Enquanto sua população é
abandonada, Obiang e sua família vivem em um luxo que surpreende até mesmo as
autoridades dos EUA e Europa. No ano passado, seu filho Teodoro Nguema Obiang
Mangue viveu um constrangimento internacional depois que seu edifício de cinco
andares na sofisticada Avenue Foch, em Paris, foi confiscado pela Justiça
francesa e avaliado em US$ 180 milhões. O prédio com 101 quartos, teatro, cinema
e banho turco tinha sido comprado pelo filho do ditador e, em 2011, vendido ao
estado da Guiné-Equatorial.
Nos banheiros, televisões foram instaladas
e talheres de ouro faziam parte dos utensílios da casa. Uma coleção de arte
ainda foi encontrada, com obras de Degas e de Rodin, e uma decoração avaliada em
US$ 50 milhões.
Na garagem, o Fisco apreendeu onze carros
de luxo - Bugatti Veyrons, Maybach, Aston Martin, Ferrari, Rolls-Royce e a
Maserati MC12 - e uma adega de vinhos avaliada em 2 milhões de euros.
A suspeita era de que a compra de
prioridades havia se transformado em uma forma de os Obiang lavar
dinheiro.
Nos EUA, as autoridades também fecharam o
cerco contra a família e, no ano passado, o filho do ditador foi obrigado a
pagar uma multa de US$ 30 milhões por desviar o dinheiro da corrupção para o
pais. Os Obiang mantinham nos EUA uma casa em Malibu, mais uma Ferrari e itens
de coleção de Michael Jackson.
"Houve um incansável roubo e extorsão",
indicou Leslie Caldwell, vice-procuradora dos EUA. "Sem nenhuma vergonha, a
família roubou seu país para financiar um estilo de vida de luxo.
Da multa de US$ 30 milhões, o governo dos
EUA decidiu usar US$ 10 milhões para programas sociais na própria
Guine-Equatorial. Afinal, o dinheiro era dessa população.
Silêncio - De repente a Beija Flor poderia
fazer o mesmo e usar parte do dinheiro que recebeu para destinar a uma escola no
país africano e garantir que aquela imagem que ela vai ajudar a enganar o mundo
não seja apenas fantasia.
O mero fato de aceitar o dinheiro já
deveria fazer a mão de quem toca o surdo suar frio. Alguém poderia dizer: agora
é tarde demais. Não há como cancelar a festa das festas.
Mas, ao mesmo tempo, com que ilusão alguém
samba sabendo que sua fantasia é financiada pela fantasia de um criminoso que
tira dinheiro da educação para alugar uma escola de samba? Ladrão de sonhos,
como diria o refrão!
Um significativo protesto seria o silencio
da bateria ao passar diante do ditador na avenida, num silêncio ensurdecedor. A
escola certamente perderia o Carnaval 2015. Mas seria reverenciada pelo mundo e,
acima de tudo, pela oprimida população da Guiné que finalmente veria a máscara
de seu ditador cair, e antes da quarta-feiras de cinza.
O desfile da Beija Flor foi sem dúvida, um show. Mas, o presidente da escola declara publicamente que: " não importa de onde vem o dinheiro", a escola deveria no mínimo ser rebaixada. É o exemplo vindo de Brasília. Quando será que teremos dirigentes dignos, honrados, que se dão ao respeito e que respeitam o povo.
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