Autor de best-seller infantil esnoba o politicamente correto
Alessandro Giannini - O Globo - 04/09/2016SÃO PAULO — De passagem pelo Brasil para lançar “Os dois terríveis — Ainda piores” (Intrínseca) e um dos astros da 24ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que termina hoje, o escritor de livros infantis americano Mac Barnett começou a se interessar pelo universo das crianças quando estava na faculdade e monitorava uma colônias de férias, na Califórnia.
Barnett era responsável pelos menores, de 4 anos, que se cansavam rápido das brincadeiras esportivas e iam se sentar ao seu lado na sombra das árvores. Era o momento em que, para passar o tempo — e dele e dos garotos —, Barnett inventava histórias. E dizia para as crianças que, nos fins de semana, era espião da rainha da Inglaterra. Logo, conta ele, virou uma celebridade entre os meninos e meninas que lhe perguntavam sobre suas aventuras como agente secreto.
A experiência de Barnett o levou a entender que as crianças aceitam a ficção como verdade, mas só até o limite do lúdico. Para o autor, esse é o grande tesouro da literatura. E, também por isso, não é fácil escrever para os pequenos:
— Falando muito sério. É fácil escrever um livro infantil, mas é muito difícil escrever um bom livro infantil. Crianças merecem arte de verdade, e arte de verdade é muito difícil de fazer! Elas não merecem “arte menor” ou “histórias menores”. O que faz boas histórias é honestidade, chegar ao centro da questão de como ser uma pessoa melhor. É difícil fazer isso. As vidas das crianças são diferentes das dos adultos, e acho que as experiências e verdades delas também são diferentes. Mas, claro, você quer chegar ao âmago dessa verdade, e isso é difícil.
“Os dois terríveis — Ainda piores”, escrito em parceria com John Rory e fartamente ilustrado por Kevin Cornell, dá prosseguimento à história dos amigos Miles Murphy e Niles Sparks, apresentados anteriormente em “Os dois terríveis”, os únicos integrantes do clube de pregação de peças do ficcional Vale do Bocejo. O primeiro livro teve os direitos comprados pela Universal para virar filme. A produção ainda não tem diretor escalado, mas Barnett acaba de escrever o roteiro.
Agora, no segundo livro, Miles e Niles pregam uma peça no diretor da escola, o senhor Bronca, que acaba sendo demitido, para ser substituído por, quem diria, o seu pai, também conhecido como senhor Bronca. A diferença entre ambos está no fato de que o veterano diretor não tolera nenhum tipo de alegria.
— Quando eu era criança, adorava pegadinhas, truques e jogos — conta o escritor, que no momento trabalha no terceiro livro da série, ainda sem título definido. — Eu acho que queria ser um pregador de peças, mas tinha medo de me envolver em problemas. Então, lia muito sobre isso. Para os adultos, há muitos filmes sobre trapaceiros ou grandes roubos a bancos, mas é diferente. Há uma dimensão política para uma pegadinha. É o último recurso dos oprimidos sobre quem tem poder. E as crianças, em geral, são as pessoas mais oprimidas da nossa sociedade.
Nesse caso, nem tudo são flores para Barnett. O autor também teve sua dose de críticas pelo teor politicamente incorreto do conteúdo dos dois livros, principalmente pelas ideias de pegadinhas aplicadas nos adultos. Mas ele ri de tudo isso:
— Quando vou às escolas, sempre há um professor no fundo da sala de aula balançando a cabeça em sinal de reprovação. Às vezes, um deles diz: “Você sabe o que acabou de fazer a essas crianças?”. E eu respondo: “Sim, claro, fiz com que eles lessem mais um livro!” Para mim, está tudo bem. As pessoas que menos gostam de brincadeiras assim são as principais vítimas.
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