sexta-feira, 30 de setembro de 2016

O ESCRITOR NÃO TEM QUE SER MODERNO, TEM QUE SER ETERNO.

Pedro Bandeira: 'O escritor não tem que ser moderno, tem que ser eterno'

Rodrigo Casarin - Página Cinco - 30/08/2016

“O escritor não tem que ser moderno, tem que ser eterno”. É com essa convicção que Pedro Bandeira está na 24ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, onde relança pela Moderna oito livros, que receberam novas capas e ilustrações – a saber: “Descanse em Paz, Meu Amor”, “Prova de Fogo”, “Brincadeira Mortal”, “O Grande Desafio”, “Gente de Estimação”, “Alice no País da Mentira”, “Histórias Apaixonadas” e & Mariana Menina e Mulher”.

Na conversa que teve na manhã desta terça-feira com o Uol, antes mesmo de ser perguntado sobre youtubers, Pedro já se antecipou: “nem sei bem o que é isso, e não tenho que saber. Tenho que passar para frente a humanidade, a verdade do escritor é eterna. Na ‘Droga da Obediência’, por exemplo, tem orelhão. Por que eu tiraria o orelhão do livro? Ele não é sobre orelhões ou telefones, é sobre valores e sentimentos”. Na sequência, lembra que Shakespeare continua sendo um dos maiores nomes da literatura mundial porque tratou em suas peças de temas inerentes ao próprio ser humano, não das peculiaridades tecnológicas de seu tempo. “Literatura não envelhece”, completa.

Sim, aos 74 anos, o autor de clássicos infantojuvenis como “Pântano de Sangue”, “A Droga do Amor” e Droga de Americana!”, amplamente adotados em escolas, e criador do grupo de amigos aventureiros Os Karas, acredita fervorosamente na qualidade literária, por isso que rejeita modismos. Ao ser questionado, por exemplo, se a linguagem utilizada hoje na literatura que faz precisa ser diferente de outrora, é enfático:

“Qual é a linguagem atual? É a gíria em uso hoje em São Paulo, no Amazonas, no Rio Grande do Sul? E daqui a dez anos? E como era em 1970? As gírias mudam com o tempo. A linguagem atual é sempre a língua portuguesa, isso não muda. É preciso usar bem a norma culta, sem abusar das palavras raras, dos parágrafos longos, das ordens indiretas”. Como argumento, lembra que em décadas passadas as pessoas utilizavam gírias que não estão mais em uso, como “gamado” ou “vidrado”, mas que “apaixonado” permanece sendo um termo plenamente compreendido.

Na conversa o autor se mostra uma pessoa convicta, de posições firmes, mas fala sobre tudo de maneira extremamente simpática, carinhosa, até mesmo amorosa, sempre sorrindo. É com esse tom que comenta uma recente polêmica a respeito de um livro seu. Pais de um colégio em Belo Horizonte fizeram um abaixo-assinado se queixando que “A Marca de Uma Lágrima”, título de 1985, tinha conteúdo erótico que poderia causar “comportamentos irreparáveis” em seus filhos pré-adolescentes.

Pedro recorda que essa não é a primeira vez que os mais conservadores veem problemas em suas obras. “Eles acham que a menarca ainda é uma criança. Sempre que escrevo tento fazer com que a personagem viva as mesmas descobertas que a menina que vai ler o livro está vivendo, trato como se fosse minha filha, com o maior amor. Então, nesse caso, trato a sexualidade no patamar de uma pessoa de 12, 13 anos, não vou além disso, justamente porque eles ainda não foram”.

No entanto, como educador, lembra que todo esse pudor pode ter um efeito contrário ao desejado. “Não estou aqui para mudar a cabeça de ninguém, respeito a pessoa ser assim, só quero que ela me respeite também. Ao tratar o sexo como um tema sujo, na verdade eles que estão colocando isso como uma sujeira na cabeça da filha deles”, diz, para depois lembrar que até em “Chapeuzinho Vermelho” & “Capuzinho Vermelho” no original, corrige -, há referência ao sexo.

Para encerrar a questão, explica: “Quando quero que alguém de 12 anos me entenda, pareço um velho ourives no trato com a palavra”. E é com todo esse cuidado que vem desenvolvendo aquele que deve ser seu próximo livro, de poesia para crianças. Já tem 15 poemas, só que ainda precisa de outros cinco ou seis para que possa reuni-los, de fato, em um volume. “Mas não posso me obrigar a fazê-los, o poema simplesmente vem”, pondera.

Por fim, voltando aos youtubers, o que Pedro pensa da ampla presença da Bienal, evento que ele participa desde 1984? “Sempre fizeram algo semelhante, antes eram os artistas de televisão, que vinham, lançavam livros e logo sumiam”.

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