VITAL
BRAZIL MINEIRO DA CAMPANHA
De autoria de Lael
Vital Brazil
Vital Brazil era filho de José
Manoel dos Santos Pereira Júnior e Mariana Carolina dos Santos Pereira. O avô
de Vital Brazil, era de uma família proprietária de terras e escravos em
Itajubá, em Minas Gerais. Para não dividir os bens, as famílias ricas, no
século XIX, casavam-se entre si. O avô de Vital Brazil não seguiu esta regra:
viveu sem se casar, por mais de trinta anos, com Maria Joaquina do Nascimento,
de família de comerciantes, com quem teve três filhos naturais. Esta condição
fez com que o pai de Vital Brazil se sentisse marginalizado por questões
materiais. Por este motivo resolveu colocar em seus seis filhos sobrenomes
diferentes do seu, inventando-os por ocasião do nascimento de cada um. O
primeiro filho nasceu no dia 28 de abril de 1865, dia de São Vital, na cidade
de Campanha, no estado de Minas Gerais. Batizou-o de Vital Brazil Mineiro da
Campanha.
Assim que se formou, Vital
Brazil casou-se com Maria da Conceição
Filipina de Magalhães e foi contratado pelo Serviço Sanitário de São Paulo. Em
1895, optou pela prática clínica, mudou-se para Botucatu, onde atendeu várias
pessoas picadas por cobras. No final do
século XIX a produção de café avançava naquela região. Muitos camponeses
morriam de picada de cobra. Em 1897 Vital Brazil veio para São Paulo trabalhar
no Instituto bacteriológico dirigido por Adolpho Lutz. Naquela época, a Peste
ameaçava a vida de milhares de pessoas, sobretudo nas regiões portuárias. O
soro demorava muito tempo para chegar ao Brasil, pois era produzido na Europa.
Em 1899 Vital Brazil passou a chefiar um laboratório do Instituto
Bacteriológico, situado na fazenda do Butantã, distante do centro de São Paulo.
Instalado em um verdadeiro estábulo, Vital Brazil começou a produzir soro
anti-pestoso.
No dia 24 de fevereiro de
1901 o Presidente Rodrigues Alves transforma este laboratório no Instituto
Butantã que passou a ser dirigido por Vital Brazil. Logo começou a produção do
soro anti-pestoso. Seu interesse em soros anti-peçonhentos era grande. Na
época, predominavam os estudos do cientista francês Calmett, baseados em cobras
Naja, inexistentes no Brasil. Vital Brazil constatou que este soro não surtia
efeito em animais contaminados com o veneno da jararaca e da cascavel. Assim
ele concluiu que o soro anti-peçonhento deveria corresponder a um tipo de cobra
específica. Cabia então produzir este soro e em seguida convencer a comunidade
científica de sua descoberta. Em 1901 produz as primeiras ampolas e começa a
publicar suas descobertas em revistas científicas. Dois anos depois apresenta
seu trabalho em um congresso médico, realizado no Rio de Janeiro.
Feita a descoberta,
produzido o soro, convencida a comunidade científica, cabia a Vital Brazil
convencer a sociedade da eficácia do soro anti-peçonhento. A estratégia
implementada foi a de estimular os fazendeiros a trocar cobras vivas por soro.
Com isso Vital Brazil pretendia distribuir o soro para os que necessitassem,
desmontar as residências à adoção do novo sistema curativo, conhecer a variedade
biológica brasileira e desenhar um mapa localizando a origem geográfica das espécies.
Ele produziu o soro anti-ofídico misturando soros de cobras de espécies
nacionais diferentes. Entre 1903 e 1919 Vital Brazil publicou cerca de oitenta artigos em revistas
científicas e o livro A Defesa contra o Ofidismo. Ele viveu 20 anos no
Butantã, onde nasceram e cresceram os nove filhos de seu primeiro matrimônio.
Em 1913 faleceram sua mãe e sua esposa.
Em 1915 o Ex-Presidente Norte Americano Theodore
Roosevelt visitou o Instituto Butantã. No mesmo ano Vital Brazil foi convidado
a apresentar suas recentes descobertas em um congresso científico em
Washington. Na volta, em Nova York, foi informado que o tratador de cobras do
jardim Zoológico local havia sido picado por uma cobra. No hospital em que foi
internado, começaram a aplicar o tratamento que se usava na época. O homem
piorava a cada hora. A direção do hospital soube da apresentação de Vital
Brazil no evento científico e solicitou que o seu soro fosse injetado no
paciente, então moribundo. Algumas horas depois o quadro começava a regredir. O
paciente sobreviveu. O jornal The New York Times descreveu o acidente e a
cura com o soro produzido médico brasileiro. Assim, as descobertas de Vital
Brazil começavam a ter reconhecimento internacional.
Em 1919 a projeção do
Instituto Butantã e de seu diretor transcediam as fronteiras nacionais e
estritamente científicas. No mesmo ano, Artur Neiva assumiu a direção do
Serviço Sanitário de São Paulo, começando a interferir no Butantã. Vital Brazil
não aceitou estas interferências. Por esta razão, pediu afastamento da
instituição. Na oportunidade recusou convite para trabalhar no Instituto
Oswaldo Cruz. Proferiu montar seu próprio laboratório em Niterói. Entre seus
assistentes constava Otávio Veiga, irmão de Raul Veiga, então Presidente do Rio
de Janeiro. Com isso, o governo deste estado doou uma área e uma receita para a
construção do novo Instituto Vital Brazil, localizou-se em uma casa na rua
Gavião Peixoto 360, esquina com Mariz de Barros.
Em 1919, Vital Brazil
começou a reconstruir sua vida em outra cidade, organizando uma outra
instituição e constituindo uma outra família. Com 55 anos de vida e nove
filhos, casou-se, em 1920, com Dinah Carneiro Viana, 30 anos mais nova que ele
com quem teve outros nove filhos. O Instituto Vital Brazil, por ele idealizado,
tornou-se uma importante empresa privada de pesquisa e produção, fabricando
produtos veterinários, biológicos (soros e vacinas) e farmacêuticos. O
Instituto oferecia também bolsas de pesquisa para estudantes, editava duas
revistas científicas e tinha uma biblioteca especializada. Em 1923, o Instituto
Vital Brazil passou a funcionar em prédios adaptados no terreno doado pelo
Governo do Estado do Rio de Janeiro. Em 1937, Vital Brazil encomendou a seu
filho Álvaro o projeto de arquitetura da atual sede da instituição.
A construção da nova sede do
Instituto revela a capacidade que Vital Brazil tinha para captar e administrar
recursos públicos e privados. Ele já havia revelado esta competência quando
ocupou a direção do Instituto Butantã. A construção da nova sede coincidiu com
o momento em que o IVB encontrava-se em plena prosperidade econômica. No final
da década de 1930, seus produtos atendiam não apenas o mercado estadual, mas
também o nacional e o internacional. A construção da nova sede coincide, ainda,
com o momento em que o Governo Vargas favorecia financeiramente empreendimentos
industriais dirigidos por empresários nacionais. Vital Brazil conseguiu
financiamento do Banco do Brasil para construir o prédio. A inauguração da nova
de sede, no dia 11 de setembro de 1943 materializa esta coincidência de
interesses.
Acompanhando uma tendência do início do século XX, O
Instituto Vital Brazil manteve, desde sua fundação, forte base familiar. Esta
empresa privada, dirigida por Vital Brazil, incorporou parentes de seus
diretores e formou novas famílias em seu interior. Dois exemplos ilustram esta
marca institucional. Com a morte de sua primeira esposa, uma irmã de Vital
Brazil passou a tomar conta de sua casa. Seu marido tinha sobrinhas que haviam
ficado órfãs no Paraná. Sensibilizado, convidou-as para trabalhar no Instituto.
Uma delas era Dinah, que veio a ser a Segunda esposa de Vital Brazil. Augusto
Esteves, desenhista do cientista desde os tempos do Butantã, veio com ele para
Niterói, atuou como administrador do Instituto e casou-se com Alvarina, filha
de Vital Brazil. Este ambiente familiar também pode ser identificado nas festas
de confraternização entre funcionários e o diretor.
A ampliação das instalações
do Instituto Vital Brazil (1943) coincidiu com o final da Segunda Guerra
Mundial (1945). Naquele momento ocorreu sensível expansão da indústria
farmacêutica multinacional sobre os países do terceiro mundo. Estas regiões do
planeta representavam significativas fatias do mercado de consumo para estes
produtos. O rápido desenvolvimento tecnológico e os preços aplicados pelas
empresas multinacionais dificultavam a sobrevivência das indústrias
farmacêuticas nacionais. Muitas vezes estas empresas estrangeiras, ao penetrar
nestes países, incorporavam as concorrentes nacionais. O Instituto Vital Brazil
não fugiu à esta tendência. As dívidas contraídas com a construção do prédio
acrescidos da elevação dos custos de produção fizeram com que a Instituição
vivesse momentos difíceis durante a década de 1940.
Vital Brazil faleceu no dia
8 de maio de 1950. A direção da empresa passou para a mãos da Sra. Dinah,
sempre auxiliada pelo seu genro Dr. Álvaro Protásio. Os prejuízos decorrentes
das dívidas com a construção da nova sede, somados aos constantes atrasos no
pagamento das empresas estatais, principais clientes do Instituto, levaram o
Instituto Vital Brazil a uma grave crise financeira. Para remediar o problema, Dona Dinah foi se desfazendo dos
imóveis que tinha e loteando parte do terreno do Instituto. Em 1957 a situação
parecia insustentável. A saída encontrada foi vender a empresa para o Governo
do Estado do Rio de Janeiro, garantindo para os herdeiros uma participação na
direção da Instituição e a esperança de que ela se mantivesse fiel ao modelo
idealizado por seu fundador: ser uma instituição de pesquisa e produção de
soros, vacinas e remédios.
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